sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Próxima Estação...[Parte 1]

Bem, faço parte da camada menos favorecida da sociedade, e como tal, utilizo o transporte de massa para me locomover. Uso preferencialmente o trem, já que neste meio de transporte não há buzinas, engarrafamento, freadas bruscas, entre outras coisas que só nosso tráfego urbano pode nos proporcionar. Para mim, a sua principal vantagem é o cumprimento quase londrino do horário de chegada e partida, bem como a duração da viagem, que raramente passa do tempo anunciado pelo maquinista. É bem claro que nem tudo são flores, e que o trem, pelo menos no Rio de Janeiro, ainda possui muitos problemas estruturais e também de conduta dos nossos amigos companheiros de viagem. No momento, o que interessa pra nós (não, não é fazer amor de madrugada, amor com jeito de virada) são as peculiaridades com as quais nos deparamos toda vez que embarcamos em um vagão. São essas peculiaridades que vou abordar em diferentes postagens, formando uma série sobre este tema: o trem.


O trem nos oferece toda a sorte de vendedores ambulantes que carregam seus produtos nos corredores dos vagões, passando entre os passageiros com extrema habilidade. Se você já andou de trem, confirmará esta afirmação sem hesitar. Se você anda de trem e nunca observou isto, é sinal que você dorme em sono profundo e por este motivo é um grande felizardo. Existem outras possibilidades também, mas isso não vem ao caso [agora].


É incrível também a criatividade que os vendedores utilizam para fazer o marketing do produto que oferece. Descrevem cada produto com uma imensa riqueza de detalhes, como se dominassem desde a obtenção da matéria-prima, até a saída do produto da fábrica (tenho a impressão de que este seja o momento mais interessante para [alguns] vendedores). Alguns criam slogans, contam historinhas, fazem piadas...enfim, estão todo o tempo querendo chamar a atenção de nós passageiros. São verdadeiros autodidatas no quesito marketing. Alguns são mais preguiçosos, ou não tiveram a oportunidade de aprender publicidade no Telecurso 2000 ou ainda não encontraram o Roberto Justus que existe dentro de si. Estes ficam no já velho e batido "atenção senhores passageiros, trago aqui o passatempo de sua viagem", e digo com convicção que estes são os que menos vendem.


Outro ponto interessante são os produtos comercializados. No trem eu posso comprar chaveiros, balas, canetas, picolé, refrigerante, água, chocolates, amendoins...produtos básicos e comuns, que são vendidos até por camelôs cadastrados pela Supervia. A coisa começa a ficar diferente, quando surge o ambulante no trem, jogando 2 bolinhas que fazem um zumbido para o alto, e anunciam tão útil produto como "cigarrinha do créu". O nome por si só já mostra o quão necessário é o nobre artigo. Num dia chuvoso, você poderá encontrar um vendedor de guarda-chuva, e ele abrirá o guarda-chuva para o seu cliente no meio do corredor, enquanto "segura" a capa do guarda-chuva com a boca. Há também a incrível caneta-chaveiro-que-vem-com-puxador-de-corda [???] pra você que vive perdendo sua caneta [???]. Você homem, que está com a barba por fazer, poderá comprar por apenas 1 real, um incrível BARBIADOR (sim, era assim que estava impresso na embalagem). Caneta-lanterna, caneta-calendário, lanterna-isqueiro e uma infinidade de produtos 2 em 1. Se você pensa que já viu de tudo, irá se surpreender quando se deparar com salames tipo italiano pendurados nos ferros do vagão. E se o crédito do seu celular acabou, estará lá para te salvar o alegre e faceiro ambulante que vende cartões de 50 reais da claro, por apenas 10 reais (aproveite porque é promoção da operadora). A maioria dos vendedores de produtos alternativos não são autorizados para trabalhar pela Supervia, então a cada estação, há uma estratégia para fugir do fiscal da companhia que admistra o trem. Mas basta dar a partida, que começa a briga pela freguesia. São homens, mulheres, adultos e crianças, desafiando a lógica da otorrinolaringologia.


Eu realmente admiro a disposição que estas pessoas têm para trabalhar e ganhar o dinheiro (nem sempre) honestamente. São pessoas que estão na informalidade porque não encontram trabalhos de carteira assinada. Não é nenhuma novidade que o desemprego é um problema grave no nosso país, mas as pessoas precisam ganhar dinheiro de alguma forma para o sustento do seu lar, e aqueles que exercem um trabalho informal devem ser respeitados como todos os cidadãos honestos devem ser.


Mas quem precisa de dinheiro e não tem o que vender, usa da criatividade para convencer os passageiros de que precisam MUITO de qualquer trocado. Mas aí já é um outro capítulo.